O Bem de Família Legal (LEI Nº 8.009/1990)

 

O Bem de Família Legal (LEI Nº 8.009/1990)

 

Diverso do bem de família estatuído pelo Código Civil, este tipo de bem de família é imposto pelo próprio Estado, por norma de ordem pública, em defesa da célula familiar. Esclarece Álvaro Villaça Azevedo que “nessa lei emergencial, não fica a família à mercê de proteção, por seus integrantes, mas defendida pelo próprio Estado, de que é fundamento”.  Neste sentido, a 3ª Turma do STJ decidiu que a impenhorabilidade do bem de família protege a entidade familiar e não o devedor. Por isso, é indisponível e irrenunciável, não podendo tal bem ser dado em garantia de dívida, exceto nas hipóteses previstas expressamente na lei.

Sendo instituidor dessa modalidade o próprio Estado, que a impõe por norma de ordem pública em defesa do núcleo familiar, independe de ato constitutivo e, portanto, de registro no Registro de Imóveis. Nada obsta a incidência dos benefícios da lei especial se o bem tiver sido instituído, também, na forma do Código Civil. Aludindo a “entidade familiar”, a referida lei não exclui da proteção as famílias monoparentais, como mencionado no item anterior.

A 4ª Turma do STJ, tendo com Relator o Ministro Luis Felipe Salomão, decidiu que a impenhorabilidade do bem de família, por ser matéria de ordem pública, pode ser arguida a qualquer tempo antes da arrematação do imóvel. O Relator esclarece que “Cumpre fazer uma distinção entre as hipóteses em que a questão já foi alegada e decidida no processo, daquelas em que a alegação advém tardiamente, depois de apresentada a defesa de mérito do devedor. Quando não há alegação, tampouco decisão anterior, a impenhorabilidade do bem de família é matéria de ordem pública, dela podendo conhecer o juízo a qualquer momento, antes da arrematação do imóvel. Por outro lado, a ausência de alegação oportuna, a depender do caso concreto, quando comprovada a má-fé, resolve-se na redistribuição dos ônus sucumbenciais, nos termos do que dispõe o art. 22 do Código de Processo Civil”. Também foi debatido no REsp. O ônus da prova sobre a impenhorabilidade do bem de família. Para o Ministro Luis Felipe Salomão, a regra do art. 333 do CPC é voltada para os casos nos quais o magistrado não está plenamente convencido sobre as alegações das partes, ou seja, somente há necessidade de a solução do litígio se apoiar no ônus da prova “quando não houver provas dos fatos ou quando essas se mostrarem insuficientes a que o julgador externe – com segurança – a solução que se lhe afigure a mais acertada.

Não há necessidade de estar registrado no Registro de Imóveis a indicação de se tratar de bem de família para que o devedor possa invocar a proteção da referida lei. O fim social da lei é proteger a vida familiar.

 

O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei. Reconhecendo os seus benefícios à entidade familiar, não se pode afastar a impenhorabilidade da residência das famílias monoparentais indicadas no § 4º do art. 226 da Constituição Federal. Aplicam-se, inclusive, às famílias formadas por um dos pais com seu filho (art. 227, § 6º, CF).

Há que se estendê-la à família substituta nas hipóteses de tutela e guarda judicial concedidas na forma do art. 33 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Não se pode afastar a possibilidade de se estender o direito à impenhorabilidade ao imóvel de uma pessoa solteira. O STJ assumiu tal entendimento equiparando o solteiro, o viúvo e o separado judicialmente, à entidade familiar, conferindo, também, a estes a proteção do “homestead”, destacando que “seu escopo definitivo é a proteção de um direito fundamental da pessoa humana, o direito à moradia. Se assim ocorre, não faz sentido proteger quem vive em grupo e abandonar o indivíduo que sofre o mais doloroso dos sentimentos, a solidão. É impenhorável por efeito do preceito contido no art. 1º da Lei nº 8.009/1990, o imóvel em que reside, sozinho, o devedor celibatário”.

Expressiva corrente jurisprudencial vem proclamando, com efeito, que a pessoa solteira, viúva, separada ou divorciada constitui também essa entidade. Confira-se: É impenhorável, o imóvel em que reside, sozinho, o devedor celibatário. A interpretação teleológica do aludido dispositivo legal revela que a norma não se limita ao resguardo da família. Seu escopo definitivo é a proteção de um direito fundamental da pessoa humana: o direito à moradia. Se assim ocorre, não faz sentido proteger quem vive em grupo e abandonar o indivíduo que sofre o mais doloroso dos sentimentos: a solidão.

(“Logo o devedor solteiro que more sozinho,  não terá o benefício dessa lei, que tem por destinatário imóvel residencial de casal ou de família” Maria Helena Diniz).

 

Instituição do bem de Família

 

Para os efeitos de impenhorabilidade, considera-se residência um único imóvel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia permanente. Na hipótese de o casal, ou entidade familiar, ser possuidor de vários imóveis utilizados como residência, a impenhorabilidade recairá sobre o de menor valor, salvo se outro tiver sido registrado, para esse fim.

O bem de família consistirá em prédio residencial urbano ou rural, com suas pertenças e acessórios, destinando-se em ambos os casos a domicílio familiar, e poderá abranger valores mobiliários, cuja renda será aplicada na conservação do imóvel e no sustento da família.  . O prédio e os valores mobiliários, constituídos como bem da família, não podem ter destino diverso ou serem alienados sem o consentimento dos interessados e seus representantes legais, ouvido o Ministério Público. Só aquele que pode alienar poderá empenhar, hipotecar ou dar em anticrese; só os bens que se podem alienar poderão ser dados em penhor, anticrese ou hipoteca.

Os valores mobiliários, não poderão exceder o valor do prédio instituído em bem de família, à época de sua instituição. O instituidor poderá determinar que a administração dos valores mobiliários seja confiada a instituição financeira, bem como disciplinar a forma de pagamento da respectiva renda aos beneficiários, caso em que a responsabilidade dos administradores obedecerá às regras do contrato de depósito.

Não se pode afastar o reconhecimento de bem de família ao único bem pertencente ao casal na hipótese de separação judicial ou dissolução de união estável, gozando o seu titular dos benefícios da lei aquele que permanecer com a guarda dos filhos.

Na hipótese de dívidas de alimentos, não pode o devedor pretender a impenhorabilidade em sua defesa, no entanto, não lhe pode ser negado o benefício da lei especial se o imóvel é a única residência do executado, onde reside com os filhos do segundo matrimônio.

Não há limite de valor para o bem de família desde que o imóvel seja a residência dos interessados por mais de 2 (dois) anos.

É neste sentido que a 3ª Turma do STJ, no REsp nº 1.126.173/MG, tendo como Relator o Ministro Ricardo Villas Bôas Cuevo, determinou a proteção da impenhorabilidade a dois núcleos familiares de forma simultânea, visando resguardar o sentido amplo de entidade familiar. O Relator esclarece que “no caso de separação dos membros da família, (...) a entidade familiar, para efeitos de impenhorabilidade de bem, não se extingue, ao revés, surge em duplicidade: uma composta pelos cônjuges e outra composta pelas filhas de um dos cônjuges”. No acórdão, ressalta-se que a Lei nº 8.009/90 tem como finalidade maior a proteção do direito fundamental à moradia.

 Por morte do instituidor, ou de seu cônjuge, o prédio instituído em bem de família não entrará em inventário, nem será partilhado, enquanto continuar a residir nele o cônjuge sobrevivente ou filho de menor idade. Num e noutro caso, não sofrerá modificação a transcrição.

A cláusula de bem de família somente será eliminada, por mandado do Juiz, e a requerimento do instituidor, ou, nos casos de morte do instituidor, ou de seu cônjuge, de qualquer interessado, se o prédio deixar de ser domicílio da família, ou por motivo relevante plenamente comprovado.

 Sempre que possível, o juiz determinará que a cláusula recaia em outro prédio, em que a família estabeleça domicílio.

 Eliminada a cláusula, caso se tenha verificado uma das hipóteses de morte do instituidor, ou de seu cônjuge, entrará o prédio logo em inventário para ser partilhado. Não se cobrará juro de mora sobre o Imposto de Transmissão relativamente ao período decorrido da abertura da sucessão ao cancelamento da cláusula.

 

Quando instituído em bem de família prédio de zona rural, poderão ficar incluídos na instituição a mobília e utensílios de uso doméstico, gado e instrumento de trabalho, mencionados discriminadamente na escritura respectiva.

São isentos de qualquer imposto federal, inclusive selos, todos os atos relativos à aquisição de imóvel, de valor não superior a cinquenta contos de réis, que se institua em bem de família. Eliminada a cláusula, será pago o imposto que tenha sido dispensado por ocasião da instituição.

 

A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido, por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

Todos os residentes, sujeitos do bem de família, são, pois, beneficiários dessa impossibilidade de apreensão judicial. Têm eles, em seu favor, esse direito ou poder de não ver constrita a casa onde moram.

    Se o casal estiver separado apenas de fato, poderá indicar, como bem de família impenhorável, apenas um único imóvel, pois a mera separação de fato, não homologada, não dissolve a sociedade conjugal. Caso contrário, haveria grande risco de fraude, pois bastaria que o casal que estivesse sofrendo uma execução declarasse uma separação de fato e, com isso, protegeria dois imóveis. Neste caso, deve ser considerado impenhorável somente o ocupado pela mulher e filhos.

    Quando se trata de condôminos que tenham residência concomitante no imóvel, o bem de família se mostra indivisível. Todos os coproprietários são beneficiados com a impenhorabilidade da residência comum, seja a dívida de um só deles, de alguns ou de todos. Do princípio da indivisibilidade decorre a consequência de que jamais se exerce o bem de família sobre parte do imóvel residencial. Qualquer dos consortes poderá, agindo como parte ou como terceiro, excluir do ato de constrição judicial toda a residência familiar.

    Tem o Superior Tribunal de Justiça reconhecido, todavia, a possibilidade de recair a constrição judicial sobre parte do bem, “quando possível o desmembramento do imóvel sem descaracterizá-lo, levando-se em consideração, com razoabilidade, as circunstâncias e as peculiaridades de cada caso”. Por outro lado, proclamou a referida Corte que, para que seja reconhecida a impenhorabilidade do bem de família, de acordo com o art. 1º da Lei n. 8.009/90, basta que o imóvel sirva de residência para a família do devedor, sendo irrelevante o valor do bem. O art. 3º da referida lei, que trata das exceções à regra da impenhorabilidade, não traz nenhuma indicação concernente ao valor do imóvel. Portanto, é irrelevante, para efeitos de impenhorabilidade, que o imóvel seja considerado luxuoso ou de alto padrão.

A impenhorabilidade, além das benfeitorias, estende-se a todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa, desde que quitados (parágrafo único do art. 1º).

 O bem de família legalmente instituído não exige a observância das formalidades previstas no Código Civil. No que tange aos bens indicados no parágrafo único, também no regime da Lei nº 8.009/1990 a impenhorabilidade não exige qualquer formalidade específica.

A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza.

 

Exceções à impenhorabilidade

 

A impenhorabilidade que recai sobre o bem de família involuntário não é absoluta, exclui-se da impenhorabilidade os veículos de transporte, obras de arte e adornos suntuosos. Entretanto, segundo a professora Maria Helena Diniz, se o automóvel estiver a serviço da residência, como ocorre frequentemente em propriedades rurais, também é impenhorável.

 Excluem-se, ainda, da impenhorabilidade os veículos de transporte, obras de arte e adornos suntuosos.  No caso de imóvel locado, a impenhorabilidade aplica-se aos bens móveis quitados que guarneçam a residência e que sejam de propriedade do locatário.

 

A impenhorabilidade não é oponível em processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, se movido:

 

I - em razão dos créditos de trabalhadores da própria residência e das respectivas contribuições previdenciárias. Trata-se de créditos alimentares, que só se configuram em relação ao empregado doméstico, ao serviçal que presta serviços no âmbito restrito da casa de família, a que falta objetivo econômico. Destarte, a exceção não abrange a empresa que terceiriza trabalhos domésticos, nem os serviços prestados por empregados de condomínio de apartamentos, que não se equiparam aos “empregados da residência. A expressão “trabalhadores da própria residência” abrange também os que ajudaram a edificá-la ou promoveram benfeitorias no mesmo imóvel, como pedreiros, marceneiros, eletricistas etc.

 

II - pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato. Assim, enfatiza a jurisprudência: Reconhecido pela instância ordinária que os recursos do financiamento garantido pelo exequente, e por ele honrado, destinavam-se ao pagamento de dívida para a aquisição do imóvel penhorado.

 

III - pelo credor de pensão alimentícia, “a pensão alimentícia como hipótese de exceção à impenhorabilidade do bem de família, tal dispositivo não faz qualquer distinção quanto à causa dos alimentos, se decorrente de vínculo familiar ou de obrigação de reparar dano”, A casa de moradia, edificada com numerário obtido junto a instituição financeira, ou mutuante particular, mediante contrato de mútuo, não fica isenta de penhora na execução promovida com base no empréstimo contraído para o fim específico de adquiri-la ou construí-la. Terceiros que não tiveram nenhuma participação no negócio não poderão obter a constrição do imóvel, salvo se forem cessionários do crédito do promitente vendedor, incorporador ou financiador. Não importa se os alimentos devidos são necessários, destinados à satisfação das necessidades primárias da vida, ou civis, direcionados à manutenção da condição socioeconômica, do status da família.

 

IV - para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar, não exprime apenas a contribuição de melhoria, mas também a mensalidade correspondente ao rateio condominial. Não fosse assim, poderia tornar-se inviável a administração dos condomínios em geral, que não teriam como se manter. Portanto, vem decidindo o Superior Tribunal de Justiça: “Consolida-se nesta Corte entendimento jurisprudencial no sentido de que passível de penhora o imóvel residencial da família, quando a execução se referir a contribuições sobre ele incidentes”, Ou ainda: A Quarta Turma alterou seu posicionamento anterior para passar a admitir a penhora de imóvel residencial na execução promovida pelo condomínio para a cobrança de cotas condominiais sobre ele incidentes.

nas execuções fiscais somente se penhora a casa familiar em caso de débitos do imposto predial e territorial urbano (IPTU), de taxa, incluindo as de poder de polícia, e ainda das contribuições de melhoria, sempre que vinculadas ao próprio imóvel residencial familiar. Tais encargos, que recaem sobre o imóvel, hão de ser.

 

V - para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar, (A exceção prevista no art. 3º, V, da Lei nº 8.009/1991, que deve ser interpretada restritivamente, somente atinge os bens que foram dados em garantia de dívidas contraídas em benefício da própria família. No caso, a hipoteca foi constituída em garantia de dívida de terceiro, o que não afasta a proteção dada ao imóvel pela lei que rege os bens de família.). Cuida-se de situação em que o devedor, na constituição de um contrato de mútuo qualquer, oferece, como garantia real, o imóvel residencial da família. A hipótese de crédito hipotecário do financiador, incorporador, construtor ou vendedor do imóvel sede da família é ressalvada no inciso II do aludido art. 3º. A solução tem sido estendida a outros casos em que o próprio devedor oferece à penhora o bem de família: Veja-se: “Penhora. Bem de família. Hipótese de indenização por ilícito penal. Nomeado o bem à penhora, voluntariamente, renunciou a ré ao benefício concedido pela Lei, sendo-lhe defeso sustentar a ineficácia do ato. Embargos improcedentes.

 

VI - por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens. Se o bem de família foi adquirido com produto do crime, não resta dúvida que o mesmo responde em sua totalidade, dada a origem criminosa dos valores despendidos em sua aquisição. Por outro lado, se se tratar apenas de execução de sentença penal condenatória a ressarcimento ou indenização devida por um dos membros da entidade familiar, por ela somente responde a sua parte ideal, já que os demais não participaram da prática do ato delituoso. O perdimento de bens, da mesma forma, somente atingirá a parte ideal do condenado criminalmente.

 

VII - por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

Não se beneficiará aquele que, sabendo-se insolvente, adquire de má-fé imóvel mais valioso para transferir a residência familiar, desfazendo-se ou não da moradia antiga.

Neste caso, poderá o juiz, na respectiva ação do credor, transferir a impenhorabilidade para a moradia familiar anterior, ou anular-lhe a venda, liberando a mais valiosa para execução ou concurso, conforme a hipótese. Quando a residência familiar constituir-se em imóvel rural, a impenhorabilidade restringir-se-á à sede de moradia, com os respectivos bens móveis, e, nos casos do Art. 5º, inciso XXVI, da Constituição, à área limitada como pequena propriedade rural.

 

 

 

Citação, Transcrição, Interpretação e Paráfrases das principais obras, "exclusivamente para fins de estudo":

 

 

 

 

  

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Contrato Agrário ou de Parceria Rural


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

atualizado em 25-08-2014/20:01:20



Referências Consultadas

 

Direito Ao Alcance De Todos