Locação - Construído Para Servir - "Built-to-Suit"

Na locação não residencial de imóvel urbano na qual o locador procede à prévia aquisição, construção ou substancial reforma, por si mesmo ou por terceiros, do imóvel então especificado pelo pretendente à locação, a fim de que seja a este locado por prazo determinado, prevalecerão as condições livremente pactuadas no contrato respectivo e as disposições procedimentais previstas nesta Lei. 

Poderá ser convencionada a renúncia ao direito de revisão do valor dos aluguéis durante o prazo de vigência do contrato de locação.     

Em caso de denúncia antecipada do vínculo locatício pelo locatário, compromete-se este a cumprir a multa convencionada, que não excederá, porém, a soma dos valores dos aluguéis a receber até o termo final da locação. 

Contrato Built to Suit (BTS) ou Contrato de Construção Ajustada pode ser definido como um contrato no qual o locador do imóvel é também responsável pela disposição das respectivas acessões e benfeitorias construídas ou adaptadas de acordo com instruções e projeto do locatário.

Construção ajustada (“built to suit”): inserido pela Lei nº 12.744/12, esta norma veio disciplinar situação cada vez mais comum nos dias atuais, onde as empresas preferem alugar um imóvel ao invés de comprá-lo. Nestes casos, o empreendedor, com escopo de atender características próprias do negócio, exige uma série de reformas ou mesmo a construção de um novo prédio (“built to suit”, ou construção sob medida ou “construção para servir”).

O proprietário do bem, por sua vez, concorda em fazer o investimento diante do compromisso de um longo contrato de locação; neste caso, o aluguel remunera não só o uso do imóvel, mas também o investimento feito.

A fim de garantir os direitos do investidor, a lei passou a permitir a renúncia ao direito de revisão do valor dos aluguéis (§ 1º), assim como abriu exceção quanto à regra que prevê o pagamento proporcional da multa compensatória (art. 413, CC), possibilitando o pagamento integral da multa, limitado, porém, aos valores dos aluguéis a receber até o termo final da locação (§ 2º).

O modelo americano do built to suit chega ao Brasil no final dos anos 1990 quando, a partir da promulgação da Lei 9.514/1997, criou-se o novo Sistema de Financiamento de Crédito Imobiliário, criando as condições para que este mercado se desenvolvesse.

Na exposição de motivos da Lei 9.514, de 20 de novembro de 1997, lê-se:
“o presente projeto de lei orienta-se segundo diretrizes de desregulamentação da economia e
modernização dos instrumentos e mecanismos de financiamento à atividade produtiva. Seu objetivo fundamental é estabelecer as condições mínimas necessárias ao desenvolvimento de um mercado financeiro imobiliário, para que se criem novos instrumentos e mecanismos que possibilitem a livre operação do crédito para o setor e a mobilização dos capitais necessários à sua dinamização”.

 

Tais condições foram:

(I) a possibilidade de securitização de créditos imobiliários;

(II) a criação dos Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI);

(III) possibilidade de criação das companhias securitizadoras de créditos imobiliários;

(IV) a instituição do regime fiduciário sobre estes títulos imobiliários; e

(V) a alienação fiduciária de bens imóveis em garantia das operações de financiamento imobiliário. Securitizar é transformar direitos creditórios – como os provenientes das vendas
a prazo nas atividades comerciais, financeiras ou prestação de serviços – em títulos negociáveis no mercado. O Certificado de Recebível Imobiliário, assim, é uma securitização de direitos creditórios originados nos financiamentos imobiliários. O Conselho Monetário Nacional, pela Resolução CMN 2.517/1998, expressamente considerou os CRI’s como valores mobiliários, para fins de observância da Lei 6.385 e, portanto, sujeição à regulamentação e fiscalização da Comissão de Valores.

Mobiliários. Nesse sentido, a instrução CVM 414/2004 estabeleceu regras para o registro de companhia aberta das sociedades securitizadoras de créditos imobiliários, assim como para as ofertas públicas desse valor mobiliário.

O regime de securitização de créditos imobiliários permitiu que o empreendedor pudesse financiar seu projeto e empreendimento antecipando seu fluxo de caixa  futuro (pagamento das parcelas futuras de contratos de compra e venda dos imóveis ou, no caso dos contratos built to suit, pagamento dos aluguéis vincendos) por meio da emissão de um título representativo desses créditos, o Certificado de Recebível Imobiliário, livremente negociável no mercado de capitais.

Por falta de tipicidade legal, o modelo BTS foi inicialmente tratado como contrato atípico cuja celebração era autorizada pelo art. 425 do Código Civil no âmbito da autonomia privada dos particulares (para um estudo mais completo sobre o contrato BTS anteriormente à Promulgação da Lei 12.744/2012 veja-se: Gaspareto e Capanema), só tendo sido reconhecido pelo direito objetivo brasileiro com a promulgação da Lei 12.744, de 19 de dezembro de 2012, a qual, inclusive adotou para o modelo BTS a denominação contrato de construção ajustada.

Na definição trazida pela Lei 12.744/2012, o contrato de construção ajustada é a locação não residencial de imóvel urbano na qual o locador procede à prévia aquisição, construção ou substancial reforma, por si mesmo ou por terceiros, do imóvel então especificado pelo pretendente à locação, a fim de que seja a este locado por prazo determinado.
Importante notar que a referida Lei 12.744/2012 trouxe para o ordenamento jurídico brasileiro a tipificação do modelo BTS fazendo-o mediante a inclusão do art.  54-A na Lei 8.245, de 18 de outubro de 1991, que dispõe sobre as locações dos imóveis urbanos e os procedimentos a elas pertinentes, Lei do Inquilinato ou Lei de  Locação dos Imóveis Urbanos. No entanto, ao fazê-lo buscou privilegiar o princípio da autonomia das partes, tão cara ao modelo americano de onde o contrato de construção ajustada inspirou-se. Assim, prescreve o dispositivo legal que neste contrato prevalecerão as condições livremente pactuadas entre as partes, bem como as disposições procedimentais previstas naquela Lei. Assim, é possível afirmar que a Lei de Locação dos Imóveis Urbanos aplica-se subsidiariamente às previsões estabelecidas nos contratos. Em outras palavras, não havendo uma exclusão expressa dos dispositivos previstos naquela lei ou não tendo o contrato disposto de maneira diversa, aplicam-se aos contratos BTS as disposições referentes às locações urbanas, tais como o direito de preferência, benfeitorias, entre outras.

 

Hipóteses de estruturação da operação built to suit

 

O modelo BTS deve ser entendido como uma típica operação de Project Finance, estrangeirismo incorporado ao vocabulário econômico que expressa uma forma de engenharia financeira suportada contratualmente pelo fluxo de caixa de um projeto, servindo como garantia os ativos e recebíveis desse mesmo projeto.
Project financing pode ser definido como a captação de fundos para financiar um projeto de investimento economicamente segregável no qual os provedores de fundos encaram primariamente o fluxo de caixa do projeto como a fonte de fundos para atender ao serviço da dívida e prover o retorno ao capital de risco investido no projeto.

Importante destacar que este modelo de Project financing via contratos BTS permite às empresas contratantes (locatárias) evitar o aumento da quantidade de seus ativos patrimoniais ou mesmo a sua diminuição (desmobilização de ativos) com a consequente liberação de capitais para reinvestimentos no próprio negócio, o que gera impactos imediatos sobre os seus índices como o ROE – Return On Equity (em português: Retorno sobre o Patrimônio), indicador financeiro percentual que se refere à capacidade de uma empresa em agregar valor a ela mesma utilizando os seus próprios recursos. Isto é, o quanto ela consegue crescer usando nada além daquilo que ela já tem.

Neste ponto entra um novo agente no contrato BTS qual seja, o investidor, normalmente um fundo de investimento imobiliário. Os Fundos Imobiliários são condomínios de investidores, administrados por instituições financeiras e fiscalizados pela CVM. Tem por objetivo aplicar recursos em negócios com base imobiliária, como desenvolvimento de empreendimentos imobiliários, imóveis já prontos ou títulos financeiros imobiliários, como CRI, LH, LCI ou cotas de fundos imobiliários já constituídos.

Nos termos da Lei 8.668, de 25.06.1993, que dispõe sobre a constituição e o regime tributário dos fundos de investimento imobiliário e dá outras providências

 “(...) Fundos de Investimento Imobiliário, sem personalidade jurídica, caracterizados pela comunhão de recursos captados por meio do Sistema de Distribuição de Valores Mobiliários, na forma da Lei nº 6.385, de 7 de dezembro de 1976, destinados a aplicação em empreendimentos imobiliários”.

Nesse modelo de operação, os recebíveis (aluguéis vincendos) darão lastro à emissão de Cédulas de Crédito Imobiliário ou Letras de Crédito Imobiliário que, por sua vez, darão lastro à emissão de Certificado de Recebíveis Imobiliários, um título de crédito nominativo, de livre negociação, lastreado em créditos imobiliários, que constitui promessa de pagamento em dinheiro. O CRI é de emissão exclusiva das Companhias Securitizadoras de Créditos Imobiliários e só pode ser emitido com uma única e exclusiva finalidade: aquisição de créditos imobiliários.
A Cédula de Crédito Imobiliário é um título representativo de crédito imobiliário, sendo financiamentos imobiliários realizados no âmbito do SFH ou do SFI, promessa de compra e venda de imóveis, operações de mútuo com garantia imobiliária ou direitos oriundos de contratos de locação, emitido com ou sem garantia, real ou fidejussória, e remunerado pelos índices de preços.
É um título executivo extrajudicial, exigível pelo valor apurado de acordo com as cláusulas e condições pactuadas no contrato que lhe deu origem. A CCI é emitida pelo credor do crédito imobiliário e poderá ser integral, quando representar a totalidade do crédito, ou fracionária, quando representar parte dele. Uma das principais vantagens deste título é o fato de o crédito nele representado poder ser utilizado como lastro de CRI – Certificado de Recebíveis Imobiliários.

Podem ser Registradores/Emissores e Custodiantes as Instituições detentoras do crédito imobiliário, como Banco Comercial (inclusive o banco cooperativo), o Banco de Investimento, o Banco Múltiplo (inclusive o banco cooperativo), a Caixa Econômica Federal, o Banco de Desenvolvimento, Sociedade de Crédito Financiamento e Investimento, a Sociedade de Crédito Imobiliário, a Sociedade Corretora de Títulos e Valores Mobiliários, a Sociedade Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários e Cia. Hipotecária autorizadas pelo Banco Central a realizar
operações de crédito imobiliário.
Podem ser Agente de Pagamento as mesmas naturezas econômicas dos Registradores acima citados e as Pessoas Jurídicas não Financeiras e Companhia Securitizadora de Créditos Imobiliários.

 

Especificação do objeto do contrato BTS – Cuidados a serem tomados

 

Sendo o BTS um contrato pelo qual uma parte concorda em construir, adaptar ou reformar um edifício de acordo com as especificações da outra parte e esta se obriga a locar este mesmo edifício por um prazo e por um aluguel determinados, não é difícil perceber que os direitos e obrigações recíprocas vão além daqueles comumente previstos na Lei de Locações Urbanas. O contrato BTS não é, obviamente, uma singela locação de imóveis.

A Lei 12.744/2012 neste ponto parece seguir a tendência do Direito Continental  (Civil Law) de aproximar-se da prática da Commom Law com sua ênfase na liberdade contratual e na vinculação das partes ao quanto contratado ao deixar a definição das regras aplicáveis aos contratos BTS à definição das próprias partes, salvo pelas disposições procedimentais previstas na Lei de Locação Urbana.

Por esta razão é natural que os analistas do modelo BTS se voltem para o mercado onde estas operações já estão estruturadas e consolidas há mais tempo, como o mercado americano, e dele extrair os principais cuidados a ele associados acelerando, com isso, a curva de aprendizado que seria natural na introdução no nosso mercado desse novo modelo.
Assim, vamos apresentar, a seguir, as principais recomendações encontradas na literatura americana relacionada aos direitos e obrigações recíprocas nos contratos BTS (cf. MOORE) e, na sequência, veremos como estes mesmos direitos e obrigações estão inseridos no ordenamento brasileiro.

Normalmente, em um contrato BTS o contratado/locador terá funções típicas de empreiteiro sob as especificações do locatário, mesmo quando o proprietário transfira as responsabilidades da construção para terceiros.

Como resultado, um contrato BTS deve incluir as especificações e cuidados típicos de um contrato de construção por empreitada além de observar aqueles específicos que decorrerão da relação duradoura que as partes manterão durante todo o prazo de locação do imóvel.
A empreitada é o contrato em que uma das partes se sujeita à execução de uma obra, mediante remuneração a ser paga pelo outro contratante, de acordo com as instruções recebidas e sem relação de subordinação (sobre contratos de empreitada, cf. Marques de Souza e Paiva).


Assim, os contratos built to suit devem observar, entre outros, os seguintes cuidados:

(I) Verificar se o local é adequado para o projeto;

Os contratantes, em especial o futuro locador, devem examinar o local, a disponibilidade de serviços de utilidade pública, o zoneamento da propriedade, os pontos de acesso, e todas as melhorias que podem ser necessárias. Neste ponto é importante lembrar que, ao contrário de uma situação de contrato de construção por empreitada típica, em um BTS, o locador é ou será dono do imóvel em que o projeto será construído, e o locatário esperará que o locador responda para sua regularidade e adequação.
Uma vez que o locatário vai impor prazos ao locador para a construção e conclusão, o proprietário precisa certificar-se se poderá haver problemas na obtenção de licenças, concessões, bem como dos riscos potenciais antes que se comprometa com datas fixas. Se o locador sabe que certas questões, por exemplo, a obtenção de uma alteração de zoneamento urbano ou permissão, podem causar atrasos, deve identificá-las no contrato e prever que os prazos serão estendidos proporcionalmente àqueles atrasos.

O proprietário também deve identificar as questões de infraestrutura que podem exigir alterações na construção. Por exemplo, se as autoridades competentes ainda não estenderam todas as utilidades e serviços para o site, o proprietário pode levar o locatário a concordar com antecedência que o locador pode prestar serviços temporários de utilidade alternativos até aquelas autoridades os providenciem. 

Em razão da legislação ambiental brasileira, o proprietário poderá, ainda, exigir garantias e compromissos por parte do locatário de que sua atividade não causará contaminação, degradação ou qualquer outra ilicitude que possa, de alguma forma, vincular a propriedade do imóvel.

A investigação preliminar sobre as condições do imóvel, seja em relação à sua localização, ao acesso a serviços públicos, às restrições por força de zoneamento urbano ou Plano Diretor, à acessibilidade a rotas de tráfego etc. é fundamental para que a discussão futura sobre a utilidade do imóvel objeto do contrato BTS seja evitada e, por consequência, o próprio contrato questionado. 

(II) Identificar precisamente o projeto;

Ambas as partes vão ter problemas se o contrato não identificar com alguma precisão e certeza o que o proprietário deve construir.

Por conta disso, as partes do contrato BTS devem gastar o tempo que for necessário na fase pré-contratual para garantir que todas as condições do contrato foram devidamente avaliadas e analisadas. Antes de assinar o contrato de BTS, o locador, por exemplo, deverá ser capaz de determinar se o local é adequado para as melhorias requeridas pelo locatário, ter um cronograma razoável para a construção, bem como uma estimativa do custo de construção, tanto para estabelecer o valor do aluguel quanto para providenciar suficiente financiamento.
O locatário, por sua vez, quererá ter certeza de que proprietário entregará as melhorias e equipamentos de que necessita para o seu negócio e a única maneira que o locatário pode ter certeza que ele vai conseguir o que quer e espera é ser o mais específico possível.
Ambas as partes estarão mais bem servidas se um conjunto de desenhos preliminares do projeto e especificações forem amplamente discutidos e acordados e passarem a fazer parte integrante do contrato.

O locador deverá incluir previsões contratuais claras determinando que o locatário pagará por todos os recursos ou equipamentos que estiverem fora do escopo inicial do projeto e, portanto, o locatário deverá ter muito cuidado com alterações do projeto ao longo da construção ou reforma do edifício, mantendo-se o mais fiel possível ao projeto inicial. Por outro lado, se alterações se fizerem necessárias, as partes certamente quererão ter uma regra previamente acordada para a alocação dos respectivos custos.
As partes têm que chegar a acordo sobre procedimentos para a elaboração e aprovação de pedidos de alteração. O proprietário pode querer ser capaz de fazer alterações que são exigidas por lei ou que são necessários para obter licenças sem o consentimento do locatário. O locatário, por outro lado, não vai querer que o proprietário seja capaz de substituir materiais ou alterações no design ou características funcionais das melhorias – mas certamente quererá poder exigir do proprietário que ele faça alterações que sejam necessárias mesmo após aprovação do plano final. Geralmente, as partes podem estabelecer prazo-limite para a aprovação pelo locatário de alterações solicitadas pelo proprietário e aprovação pelo locador de
alterações solicitadas pelo locatário.

O contrato poderá estabelecer, ainda, que na medida em que o locatário solicite alterações nos planos que impliquem mais custo, ele arque com este custo adicional, em um montante fixo, antes ou durante a construção, ou por meio de um aumento no valor do aluguel que vai amortizar a melhoria custos, com o fator de juros pactuados.

Questões como manutenção do imóvel depois de entregue ao locatário, adaptações, novas reformas e, principalmente, garantia das funcionalidades e da qualidade do imóvel, equipamentos e acessórios, devem ser necessariamente endereçados pelo contrato.
A garantia sobre o imóvel prevista nas disposições aplicáveis ao contrato de empreitada, por exemplo, não se adéquam necessariamente ao BTS na medida em que o imóvel entregue pelo construtor é do locador, ainda que o projeto originalmente seja do locatário.

(III) Especificar termos de conclusão e aceitação do imóvel;

O locatário vai querer ter certeza de que as melhorias foram construídas de acordo com os planos e especificações aprovadas, que todos os serviços públicos estão conectados, e que todos os sistemas mecânicos estão funcionando corretamente, por isso, vai querer inspecionar e aprovar as melhorias antes de considerá-las concluídas. 

O objetivo do proprietário, por sua vez, é o de evitar que o locatário rejeite as melhorias, a menos que elas não estejam de acordo com os projetos finais. O contrato, portanto, deverá endereçar este momento da vistoria, inclusive admitindo, se necessário, a participação de um terceiro, independente e neutro, para confirmá-la.
Além disso, o contrato poderá ainda estipular que as partes prepararão e concordarão com uma eventual lista de pendências a serem solucionada em um determinado prazo sob pena de consequências também nele previstas.

Neste ponto, o proprietário estará com pressa para que o locatário entre na posse do imóvel e comece a pagar seu aluguel (ou a sua renda total se o contrato fixou o pagamento de um aluguel parcial durante a construção). Ele também quererá a declaração de ter cumprido o prazo de conclusão de construção e, com isso, evitar possíveis sanções contratuais que incorreria em caso de atraso. Consequentemente, o proprietário buscará estabelecer prazos para a vistoria e a aprovação pelo locatário. Por outro lado o locatário, ainda que tenha a mesma pressa para entrar na posse do imóvel, quererá ter tempo suficiente para realizar a avaliação com precisão. Por isso, é importante que as partes não subestimem este ponto do contrato e tenham certeza de que o prazo fixado e a forma de aceitação da obra pelo locador lhes sejam confortáveis.

 

(IV) Olhar para o futuro;

O contrato BTS é uma relação de longo prazo entre o proprietário e o locatário e, como vimos, com poucas possibilidades de saída ou revisão desta relação. Por esta razão as partes, ao entrarem neste contrato, devem ter olhos para o futuro, buscando antever questões como: crescimento da atividade do locatário e necessidade de expansão ou adequação de suas instalações; mudanças do entorno, inclusive potencial mudança de zoneamento urbano; mudança do mercado imobiliário com o crescimento de oferta de novos imóveis para locação; possíveis alterações de conjuntura econômica nacional ou internacional e seus reflexos na liquidez e capacidade de pagamento por parte do locatário; possibilidade de aquisição do imóvel
por parte do locatário ou terceiros etc.

 

Revisão do valor do aluguel


Como aponta Zanchim, uma das primeiras normas brasileiras a tratar sobre o tema da revisão judicial de contratos por desequilíbrio de prestações por força da alteração das circunstâncias foi o Decreto 24.150, de 20 de abril de 1934, que fixou critério objetivo para a intervenção judicial em contratos de locação por força de mudanças no contexto econômico que implicasse uma variação superior a 20% “das estimativas feitas”.
O referido Decreto foi revogado pela Lei 8.245/1991, mas esta, no seu art. 19, permite a revisão judicial do preço do aluguel, não havendo acordo entre locador e locatário, após três anos de vigência contratual ou do acordo anteriormente realizado, a fim de ajustá-lo ao preço do mercado (Diniz, 127). O procedimento da ação revisional está previsto nos arts. 68 a 70 daquela mesma Lei.
Esta possibilidade legal de revisão judicial do preço do aluguel é um importante remédio para as partes contratantes para adequarem o contrato ao mercado imobiliário de locação, permitindo assim, tanto ao locador quanto ao locatário, uma saída para manter o contrato de locação e, ao mesmo tempo, ajustar o valor do aluguel para que fique condizente com o cobrado para a locação de imóveis semelhantes na mesma região.

Ocorre que, como vimos anteriormente, a lógica financeira dos contratos BTS é outra. Trata-se de financiamento de projeto e, desta forma os aluguéis são fixados a partir de cálculos econômicos e financeiros prevendo a devolução do valor investido acrescido do valor necessário para a remuneração do capital e o ganho atrativo o suficiente para garantir a participação dos investidores.

Ademais, os aluguéis em um contrato BTS normalmente são securitizados, vale dizer, dão lastro à criação de títulos representativos desses recebíveis que serão, então, negociados no mercado e monetizados pelo locador. Por esta razão, a revisão do valor dos aluguéis, para maior ou para menor, não é particularmente interessante para essa operação.
Por esta razão, a § 1º do art. 54-A dispôs que “poderá ser convencionada a renúncia ao direito de revisão do valor dos aluguéis durante o prazo de vigência do contrato de locação”.
Com esta disposição contratual, independentemente da variação do mercado imobiliário de locação local, as partes do contrato BTS e, principalmente, os investidores, terão a certeza e a tranquilidade de saber que os aluguéis não se alterarão.
Esta renúncia ao direito de revisão do valor dos aluguéis, todavia, a nosso ver, não afasta de todo a possibilidade da revisão judicial dos contratos BTS.

Ademais, os aluguéis em um contrato BTS normalmente são securitizados, vale dizer, dão lastro à criação de títulos representativos desses recebíveis que serão, então, negociados no mercado e monetizados pelo locador. Por esta razão, a revisão do valor dos aluguéis, para maior ou para menor, não é particularmente interessante para essa operação.
Por esta razão, a § 1º do art. 54-A dispôs que “poderá ser convencionada a renúncia ao direito de revisão do valor dos aluguéis durante o prazo de vigência do contrato de locação”.
Com esta disposição contratual, independentemente da variação do mercado imobiliário de locação local, as partes do contrato BTS e, principalmente, os investidores, terão a certeza e a tranquilidade de saber que os aluguéis não se alterarão.
Esta renúncia ao direito de revisão do valor dos aluguéis, todavia, a nosso ver, não afasta de todo a possibilidade da revisão judicial dos contratos BTS. O art. 317 do Código Civil brasileiro dispõe que “Quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o do momento de sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor real da prestação”.

A cláusula rebus sic stantibus “é a abreviação da fórmula contractus qui habent tractum sucessivum et dependentiam de futuro rebus sic stantibus intelligentur.

A verificação da imprevisibilidade, contudo, não é algo simples de se fazer e, diante das divergências teórica e jurisprudencial, várias figuras jurídicas vêm sendo agregadas na tentativa de sua definição, sendo a mais comum a boa-fé (Zanchim).

Ainda Zanchim: “Assim, antes da intervenção judicial em um contrato, deve-se perguntar primeiro se o evento que desequilibra as prestações foi causado por uma das partes. Sendo positiva a resposta, não é o caso de revisão, mas de responsabilidade civil. Sendo negativa, passa-se à segunda pergunta: o evento está na álea ordinária, natural ou comum do contrato? Se sim, afasta-se a revisão. Se não, ela se justifica”.

 

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APELAÇÃO. LOCAÇÃO DE IMÓVEL NÃO RESIDENCIAL. AÇÃO REVISIONAL DE ALUGUEL CUMULADA COM PEDIDO PROVISÓRIO. CONTRATO IMOBILIÁRIO QUE, POR TERMO ADITIVO CELEBRADO EM MOMENTO POSTERIOR AO ORIGINAL, NOVAS REGRAS E CONDIÇÕES FORAM REPACTUADAS, AMOLDANDO-SE AO MODELO DENOMINADO BUILT TO SUIT (BTS). RECONHECIMENTO DESSA OPERAÇÃO. OBRA EXECUTADA NOS IMÓVEIS ALUGADOS DE AMPLA REESTRUTURAÇÃO, COM DIVERSAS MELHORIAS REALIZADA PELA RÉ (LOCADORA) PARA PROPICIAR PLENO ATENDIMENTO À ATIVIDADE PROFISSIONAL DESEMPENHADA PELA AUTORA (LOCATÁRIA). FATO INCONTROVERSO. AMPLIAÇÃO DO PRAZO DA LOCAÇÃO E REAJUSTE DO ALUGUEL. ANUÊNCIA DAS PARTES AO CUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO. No caso em julgamento, impossível não reconhecer, com o termo aditivo ao contrato de locação celebrado entre as partes, a figura do modelo “Built to Suit”. Isso porque ampla reforma nos imóveis alugados foram realizadas para possibilitar melhor adaptação, além de benfeitorias, tudo para atender a atividade social desempenhada pela autora, sem arcar com nenhum custo para a execução da obra completa. Essas novas disposições em proveito da autora redefiniram o prazo de vigência da locação e o valor dos aluguéis, elementos gerais que, por certo, envolvem as questões desse tipo de contrato.

APELAÇÃO. LOCAÇÃO DE IMÓVEL NÃO RESIDENCIAL. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DENOMINADO BUILT TO SUIT (BTS). RECONHECIMENTO, NO CASO. REVISÃO DO VALOR DO ALUGUEL POR ARGUIÇÃO DE ONEROSIDADE EXCESSIVA AFASTADA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO. Malgrado não tenha declarado expressamente a renúncia ao direito de revisão do valor dos aluguéis, em verdade, quando a autora se propôs, no ato da assinatura, a cumprir as obrigações previstas no termo aditivo ao contrato, a ré, por sua vez, assumiu o encargo de adimplir com sua parte nesse instrumento particular, o que foi cumprido. Invocar, em momento posterior, a revisão do valor do aluguel, viola, sim, os termos escritos da contratação pactuada livremente, não admitindo correção judicial por alegada onerosidade excessiva de uma das partes. Ademais, a impossibilidade de revisão do valor do aluguel resulta, também, da própria natureza das obrigações contraídas por ambas as partes e pela finalidade do aluguel ajustado não apenas a remunerar o uso do imóvel, como também a compensar as despesas realizadas pela ré com a reforma substancial do prédio locado.

APELAÇÃO. LOCAÇÃO DE IMÓVEL NÃO RESIDENCIAL. AÇÃO REVISIONAL DE ALUGUEL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DECORRENTES DA SUCUMBÊNCIA DA AUTORA. PEDIDO DE REEXAME POR CONSIDERA DAR ELEVADA E ALTERAÇÃO DO ARBITRAMENTO POR EQUIDADE. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA REGRA GERAL PREVISTA NO ART. 85, §2º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC). RECURSO IMPROVIDO. A fixação por equidade pleiteada pela autora, a título de honorários advocatícios, é regra subsidiária, segundo dispõe o art. 85, §8º, do CPC, não podendo ser utilizada neste caso. A linha obrigatória a ser seguida, em termos de estipulação de honorários advocatícios pela sucumbência da autora na demanda, observa entre a tarifação mínima e a máxima prevista no art. 85, §2º, do CPC, sobre o valor atualizado da causa.

(Apelação Cível nº 1002115-32.2018.8.26.0006 (Digital) Comarca : São Paulo FR da Penha de França 1ª Vara Cível)

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Denúncia antecipada do contrato


Assim como a revisão do valor dos aluguéis subverte a lógica do contrato BTS e do project financing por trás deste modelo, a possibilidade de denúncia do contrato, resilição, especialmente pelo locatário, também tem o mesmo efeito de trazer insegurança para um contrato que necessariamente deve ser pensado em longo prazo. De fato, “a devolução do imóvel, em pleno curso do contrato, tiraria do empreendedor-construtor o maior atrativo do negócio, que é a certeza da percepção dos aluguéis, pelo prazo necessário ao retorno do capital investido” (Souza).

Pois é nesse contexto que a Lei 12.744/2012 traz a previsão do § 2º do art. 54-A, dispondo que, em caso de denúncia antecipada do vínculo locatício pelo locatário, compromete-se este a cumprir a multa convencionada, que não excederá, porém, a soma dos valores dos aluguéis a receber até o termo final da locação.
Esta redação permite claramente concluir, por outro lado, que o contrato BTS pode prever multa convencional para o caso de resilição igual ao valor da soma dos valores dos aluguéis a receber até o seu termo final.

Esta disposição traz segurança aos investidores, pois, garante o adimplemento dos títulos correspondentes aos recebíveis daquele contrato.

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O apelo nobre, fundamentado no artigo 105, inciso III, alínea "a" da CF/88, visa reformar acórdão proferido pelo TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS, assim resumido:
APELAÇÃO CÍVEL - EMBARGOS À EXECUÇÃO - CONTRATO DE LOCAÇÃO - CUMULAÇÃO DE MULTAS MESMO FATO GERADOR - BIS IN IDEM - INADMISSIBILIDADE Quanto à controvérsia, pela alínea "a" do permissivo constitucional, alega violação do art.54-A, da Lei 8245/91, no que concerne à inocorrência de bis in idem, trazendo o(s) seguinte(s) argumento(s):
Guardada vênia, ocorre que há um claro equivoco de premissa em relação ao fundamento adotado pelo r. acórdão, resultando em contrariedade à regra disposta pelo art. 54-A da Lei de Locações (Lei n° 8.245/9 1). E que há no caso em comento duas penalidades decorrentes de duas infrações distintas. Explica-se. A Cláusula Décima Terceira prevê multa geral para quaisquer das partes e, para o caso de infração a qualquer das obrigações contratuais: [...] (fls. 347).
Já a Cláusula Décima Quinta decorre da redação do art. 54-A da Lei de Locações, pois estipula verdadeira indenização para que a parte locadora seja ressarcida das perdas e danos ocasionadas em caso de denúncia antecipada do ajuste, haja vista os substanciais investimentos demandados no Contrato celebrado em sua modalidade built to suit (fls. 349).
Por essa razão, não se pode ter dúvidas de que a lei que regula o contrato built to suit, estabelece, diferentemente dos princípios protetivos ao locatário, maior amplitude à autonomia da vontade, ou seja, as cláusulas livremente pactuadas são válidas e não padecerão de nulidade, porque o pressuposto das locações convencionais (vulnerabilidade do locatário) não está presente nos contratos built to suit, pois a edificação foi feita sob medida para o Locatário.
Assim sendo, as cláusulas livremente pactuadas nestes modelos de contratação serão válidas e plenamente exigíveis, por foiça do que determina o já transcrito art. 54-A da Lei n° 8.245191. (fls. 349).
22. Destarte, ocorrida a denúncia antecipada do vinculo locatício pela Recorrida e sendo o valor total das multas consonante com a legislação em vigor, deverá ser cumprido o que foi pactuado entre as partes, motivando a admissão e provimento do recurso especial, para hipótese de cabimento prescrita pela alínea "a" do art. 105, inc III da Constituição, com reforma do acórdão recorrido para se declarar a improcedência dos embargos à execução manejados pela Recorrida, sob pena de se perpetuar contrariedade ao que dispõe o art. 54-A da Lei n° 8.245/91. IV (fls. 353)

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.650.554 - MG (2020/0012206-6)

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Sublocação

 

Como esclarece Diniz, a sublocação será admitida se não for expressamente proibida; essa regra, porém, é inaplicável à locação de prédio urbano, para o qual a sublocação é proibida, a menos que haja prévio consentimento por escrito do locador.
A relação sublocatícia não passa de uma permissão do locador, regida no que couber, pelas mesmas disposições legais relativas à locação.

De pronto, esclareça-se que a sublocação prevista nos arts. 14 a 16 da Lei de Locação dos Imóveis Urbanos é absolutamente compatível com o modelo BTS.

Um ponto que surge, no entanto, é o da previsão inserta no art. 43 daquela lei, que determina constituir contravenção penal, punível com prisão simples de cinco  ias a seis meses ou multa de três a 12 meses do valor do último aluguel atualiza do, revertida em favor do locatário, exigir na sublocação, aluguel maior do que o estipulado no contrato de locação original.

Como os contratos de locação no modelo BTS são contratos de longo prazo e, como vimos, com possibilidade de renúncia expressa ao direito de revisão dos aluguéis é possível que, em determinado momento, o mercado imobiliário esteja aquecido e que seja possível e interessante para o locatário sublocar o imóvel por um valor maior.

De fato, está claro que o modelo BTS serve à expansão da oferta imobiliária na medida em que cria mecanismos de financiamento para a construção de novos edifícios, com isso diminuindo a pressão da demanda de imóveis para locação sobre a oferta de imóveis disponíveis, ajudando a diminuir o valor dos aluguéis, o que é o oposto da especulação. Além disso, também está claro que, ao entrar em um contrato de longo prazo com regras que fixam o valor dos aluguéis durante sua vigência e ao oferecer as garantias necessárias para que este contrato BTS.
se mantenha de pé e atraia investidores, o locatário assume todos os riscos, riscos maiores, inclusive, do que aquele que poderá repassar ao sublocatário (riscos estes no mínimo correspondentes àqueles envolvidos com a fase inicial do contrato BTS, o da construção do próprio edifício). Assim, parece-nos razoável que, em caso de sublocação, o sublocador, neste caso, possa pedir um aluguel superior àquele do seu próprio contrato de locação.

A Lei de Registros Públicos – Lei 6.015, de 31 de dezembro de 1973 – dispõe, em seu art. 129, que estão sujeitos a registro, no Registro de Títulos e Documentos, para surtir efeitos em relação a terceiros, os contratos de locação de prédios, ressalvando, ainda, a obrigatoriedade do registro do contrato no Registro de Imóveis caso tenha sido consignada cláusula de vigência no caso de alienação da coisa locada.
É caso excepcional de duplo registro. Levado a assentamento apenas no de títulos, preserva posse direta do locatário, ainda que venha a ser turbada por terceiro que exiba segundo contrato locatício firmado pelo proprietário ou comprovante de registro de seu título aquisitivo na serventia imobiliária (Ceneviva).

Evidentemente, considerando-se o longo período de vigência do contrato BTS e o comum processo de securitização dos recebíveis dele decorrentes, as partes terão todo o interesse no registro deste contrato tanto no Registro de Títulos e Documentos como no Registro de Imóveis, garantindo a sua oponibilidade a terceiros e sua manutenção mesmo em face da alienação do imóvel (esta última, possível inclusive por força de excussão judicial em razão de dívida do proprietário).

  

 

Citação, Transcrição, Interpretação e Paráfrases das principais obras, "exclusivamente para fins de estudo"

Araújo Júnior, Gediel Claudino de Prática de locação: lei do inquilinato anotada, questões práticas, modelos de peças / Gediel Claudino de Araújo Júnior. – 8. ed., rev., ampl. e atual. – São Paulo: Atlas, 2018.

Lei do inquilinato comentada artigo por artigo: visão atual na doutrina e jurisprudência / Adriana Marchesini dos Reis... [et. al.]; organização Luiz Antonio Scavone Junior, Tatiana Bonatti Peres. – 1. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2016.

 

 

Dos Bens Incorpóreos no Direito Imobiliário 

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