A eficácia da decisão deste processo abrange todo o território nacional, para as matrizes e filiais das rés Loggi e L4B.
Determina-se o levantamento do segredo de Justiça decretado, viabilizando-se a publicidade
dos atos processuais e do conteúdo do feito.
"o trabalho não é mercadoria".
Como se viu, o motorista de van ou o motofretista atendem aos clientes da LOGGI e da LB4, recebendo da LOGGI a determinação de seu frete, sua rota, seu trabalho, tempo de entrega, forma de entrega, tudo pelo aplicativo. Portanto, não é a utilização de meios tecnológicos que desnatura a contratação entre as partes como relação de emprego.
Deixar o trabalhador por aplicativo à margem das garantias e dos direitos sociais afigura-se inconstitucional.
Fosse autônomo o motorista, a máquina seria dele e ele cobraria para si o frete, não para a LOGGI.
Também o relacionamento do motofretista ou motorista de van com a LOGGI não é negociado entre ambos, mas parte de um termo de adesão, denominado "Termos e Condições", impostas pela plataforma. O motorista se cadastra na plataforma mediante a requisição de determinada documentação exigida pela Loggi. Nada disso é negociado.
Não é o motofretista que escolhe a entrega, mas aceita, ou não, a que lhe é ofertada pelo aplicativo.
O condutor cadastrado não pode passar o serviço a terceiro, sob pena de fraude ao sistema, como é lógico. Se o é do condutor João, não poderá José login fazer a entrega. Isso traduz pessoalidade na prestação de serviços.
O condutor se cadastra através da plataforma da LOGGI, não por outro meio. Este precisa ser MEI (Microempresa individual), sendo esse um requisito para sua adesão.
Se não há negociação quanto a esta, trabalho autônomo não é. O preço do frete é salário, fixado somente pelas rés. O condutor se subordina ao valor do frete.
"o motofretista não só vende o seu trabalho, mas também o uso da propriedade da sua moto, pois sem a moto não poderia ter o exercício do frete", conforme a cláusula 3.4 do contrato entre o motofretista e a LOGGI (fl. 525, pág. 5 da defesa). Não há, portanto, controvérsia acerca da onerosidade.
Deixar o trabalhador por aplicativo à margem das garantias e dos direitos sociais afigura-se inconstitucional, repita-se. Deixá-lo à margem da garantia de segurança, de limitação de jornada, de férias, de descanso semanal remunerado, de décimo terceiro salário significa retroceder nos direitos sociais a um tempo muito anterior à própria CLT de 1943. Significa o retrocesso à Idade Média, ao "laissez faire", mas sem qualquer proteção. A exclusão de tais trabalhadores do manto dos direitos sociais é um retorno ao momento anterior à Revolução Industrial, ocorrida há dois séculos atrás. Há dois séculos atrás, na França e na Inglaterra já se estipulava a limitação à jornada, o direito ao DSR. Há um século já se regulava salário mínimo,
a proteção contra acidentes, os seguros sociais.
Nesse sentido, cumpre ao empreendedor obedecer a Constituição Federal e as leis trabalhistas, fomentando um real desenvolvimento nacional, não apenas de seu negócio e do negócio de seus clientes. Há que se ver seus trabalhadores também como seus clientes.
Diante de todo o exposto, julga-se procedente o pleito de declaração de relação de emprego entre a LOGGI TECNOLOGIA LTDA. e os condutores profissionais que prestam serviços de transporte de mercadoria através de suas plataformas digitais.
Ressalte-se que a presente declaração de emprego vincula toda e qualquer relação jurídica de
condutores com a LOGGI, visto que se dá no bojo de uma Ação Civil Pública.
A multa requerida pelo Ministério Público do Trabalho por eventual descumprimento das obrigações de fazer, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), por infração e por trabalhador encontrado em situação irregular, afigura-se compatível com o porte da empresa, bem como com os bens que se pretende assegurar.
Em decorrência do reconhecimento da existência de relação de emprego, deverá a ré LOGGI efetuar o registro em sistema eletrônico de todos os condutores profissionais cadastrados em seu sistema que tiveram efetiva atividade nos últimos dois meses, desde 06.10.2019, bem como daqueles que voltarem a se ativar pela LOGGI ou nela se cadastrarem a partir da prolação desta sentença (06.12.2019). Defere-se o prazo de 3 meses para a regularização, ou seja, até 06.03.2020, sob pena de pagamento de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), por infração e por trabalhador encontrado em situação irregular, reversível à Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo.
Não colhe frutos a assertiva de eventualidade na prestação de serviços perigosos, porque a utilização da moto é da essência da entrega. Assim, mesmo a entrega por tempo "extremamente reduzido" deverá ser remunerada com o adicional de periculosidade correspondente.
Saliente-se que a empresa deverá fazer constar o adicional de periculosidade em rubrica própria, a fim de se resguardar e facilitar eventual fiscalização do pagamento, inclusive pelos próprios condutores.
Diante do exposto, deverá a LOGGI implementar o pagamento de adicional de periculosidade, na base de 30% sobre o valor bruto do frete devido aos seus condutores, em rubrica própria, a partir de 06.03.2020, sob pena de pagamento de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), por infração e por trabalhador encontrado em situação irregular, reversível à Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo.
Diante disso, julga-se procedente o pleito de contratação de apólice de seguro de vida complementar, em favor dos condutores da LOGGI, com coberturas em caso de invalidez permanente, nos termos do art. 14 da Lei Municipal de São Paulo nº 14.491/07.
Diante disso, deverá a LOGGI considerar como jornada de trabalho de seus condutores o tempo de deslocamento até os pontos de coleta e entrega, na condução efetiva do veículo, bem como o tempo integral de coleta e de entrega das mercadorias, aí incluído todo o tempo de espera pelo cliente e para a conclusão do frete aceito, sob pena de pagamento de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), por infração e por trabalhador encontrado em situação irregular, reversível à Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, a partir de 06.03.2020.
Diante disso, deverá a primeira ré limitar a jornada diária de trabalho de seus condutores ao máximo de 8 (oito) horas de serviço por dia, observando-se o tempo de condução da moto e de espera para coleta e entrega na realização do frete, conforme tópico anterior, sob pena de pagamento de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), por infração e por trabalhador encontrado em situação irregular, reversível à Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, a partir de 06.03.2020.
Diante disso, determina-se à LOGGI que disponibilize base para ponto de encontro ou espera, com condições adequadas de segurança, sanitárias e de conforto, para repouso e descanso dos motoristas e condutores profissionais (art. 157, inciso I, da CLT, c/c item 17.5.1 da NR-17, com redação da Portaria nº 3.751/1990), em quantidade suficiente com o fornecimento de água potável nos locais de descanso.
Diante disso, determina-se que a ré LOGGI forneça capacetes certificados de motociclistas, bem como coletes de segurança dotado de dispositivos retrorreflexivos, a 5.000 condutores dentre os , com especificação no mais ativos em sua plataforma, à sua escolha, exigindo seu uso PPRA, sob pena de pagamento de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), por equipamento faltante da quota mencionada, reversível à Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, a partir de 06.03.2020.
DISPOSITIVO
Diante do exposto, o Juízo da 8ª Vara do Trabalho de São Paulo, nos autos do processo nº 1001058-88.2018.5.02.0008, julga PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos feitos na Ação proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO em face de LOGGI TECNOLOGIA LTDA. e L4B LOGISTICA LTDA., na forma da fundamentação, a fim de declarar a existência de relação de emprego entre a LOGGI TECNOLOGIA LTDA. e os condutores profissionais prestam serviços de transporte de mercadoria através de suas plataformas digitais, bem como condenar a empresa LOGGI TECNOLOGIA LTDA. às seguintes obrigações de fazer:
1. efetuar o registro em sistema eletrônico de todos os condutores profissionais cadastrados em seu sistema que tiveram efetiva atividade nos últimos dois meses, desde 06.10.2019, bem como daqueles que voltarem a se ativar pela LOGGI ou nela se cadastrarem a partir da prolação desta sentença (06.12.2019), com regularização até 06.03.2020,sob pena de pagamento de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), por infração e por trabalhador encontrado em situação irregular, reversível à Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo.
2. abster-se de contratar ou manter condutores contratados como autônomo, por meio de contratos de prestação de serviço, de parceria ou qualquer outra forma de contratação civil ou comercial, sob pena de pagamento de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), por infração e por trabalhador encontrado em situação irregular, reversível à Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, aplicável a partir de 06.03.2020.
3. observar os requisitos para as atividades de entrega de mercadorias fixadas pelo art. 2º, exigindo de seus condutores a idade mínima de 21 anos, 2 anos de habilitação na categoria, aprovação em curso do CONTRAN, uso de colete de segurança dotado de dispositivos retroreflexivos (art. 2ª da Lei nº 12.009/09), sob pena de pagamento de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), por infração e por trabalhador encontrado em situação irregular, reversível à Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, aplicável a partir de 06.03.2020.
4. abster-se de contratar condutor inabilitado legalmente e vetar o uso de motocicleta ou motoneta que esteja em desconformidade com as exigências legais (art. 7º Lei nº 12.009/09),sob pena de pagamento de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), por infração e por trabalhador encontrado em situação irregular, reversível à Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, aplicável a partir de 06.03.2020.
5. abster-se de instituir prêmio por produção, taxa de entrega ou comissão, em caráter individual ou coletivo, como forma de pagamento de salário ou remuneração, não permitindo que os ganhos de produtividade dos seus empregados motociclistas se deem com a intensificação do trabalho ou aumento da carga de trabalho, de acordo com o art. 1º da Lei Federal nº 12.436/11, sob pena de pagamento de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), por infração e por trabalhador encontrado em situação irregular, reversível à Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, aplicável a partir de 06.03.2020.
6. implementar o pagamento de adicional de periculosidade, na base de 30% sobre o valor bruto do frete devido aos seus condutores, em rubrica própria, a partir de 06.03.2020, sob pena de pagamento de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), por infração e por trabalhador encontrado em situação irregular, reversível à Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo.
7. comprovar a disponibilidade de imóvel apto ao estacionamento dos veículos, às dependências para escritório e aos condutores no aguardo de ordens de serviço, nos termos do art. 4º, III, da Lei Municipal de São Paulo nº 14.491/07, sob pena de pagamento de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), reversível à Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, a partir de 06.03.2020.
8. considerar como jornada de trabalho de seus condutores o tempo de deslocamento até os pontos de coleta e entrega, na condução efetiva do veículo, bem como o tempo integral de coleta e de entrega das mercadorias, aí incluído todo o tempo de espera pelo cliente e para a conclusão do frete aceito, sob pena de pagamento de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), por infração e por trabalhador encontrado em situação irregular, reversível à Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, a partir de 06.03.2020.
9. implementar de forma efetiva e eficaz o controle da jornada de trabalho dos seus motoristas e condutores profissionais, documentando-a por meio eletrônico que garanta inviolabilidade e inalterabilidade dos eventos informados pelo motorista e captados pela plataforma.
10. promover a disponibilização de acesso telemático de informações necessárias à checagem da jornada por parte das autoridades administrativas e judiciais competentes, bem como o acompanhamento e fiscalização por parte dos próprios condutores.
11. limitar a jornada diária de trabalho de seus condutores ao máximo de 8 (oito) horas de serviço por dia, observando-se o tempo de condução da moto e de espera para coleta e entrega na realização do frete, conforme tópico anterior, sob pena de pagamento de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), por infração e por trabalhador encontrado em situação irregular, reversível à Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, a partir de 06.03.2020.
12. implementar o período mínimo de 11 (onze) horas consecutivas para descanso entre duas jornadas de trabalho, nos termos do art. 66 da Consolidação das Leis do Trabalho, de forma automática pelo sistema, sob pena de pagamento de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), por infração e por trabalhador encontrado em situação irregular, reversível à Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, a partir de 06.03.2020.
13. implementar o descanso semanal de 24 (vinte e quatro) horas consecutivas, nos termos do art. 67, caput, da Consolidação das Leis do Trabalho, de forma automática pela plataforma, sob pena de pagamento de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), por infração e por trabalhador encontrado em situação irregular, reversível à Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, a partir de 06.03.2020.
14. disponibilizar base para ponto de encontro ou espera, com condições adequadas de segurança, sanitárias e de conforto, para repouso e descanso dos motoristas e condutores profissionais (art. 157, inciso I, da CLT, c/c item 17.5.1 da NR-17, com redação da Portaria nº 3.751/1990), com o fornecimento de água potável em quantidade suficiente nos locais de descanso.
15. adequar e implementar o PPRA, de acordo com a NR 9, reconhecendo e especificando todos os riscos presentes, de acordo com o produto transportado, definindo-se, para cada caso, as medidas de proteção necessárias, incluindo-se os equipamentos de proteção individual obrigatórios às atividades e incluindo no documento as avaliações quantitativas programadas.
16. adequar e implementar o PCMSO, após a revisão do PPRA, de acordo com os riscos a que os trabalhadores estão expostos, obedecendo-se ao disposto na NR 7.
17. fornecer capacetes certificados de motociclistas, bem como coletes de segurança dotado de dispositivos retrorreflexivos, a 5.000 condutores dentre os mais ativos em sua plataforma, à sua escolha, exigindo seu uso, com especificação no PPRA, sob pena de pagamento de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), por equipamento faltante da quota mencionada, reversível à Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, a partir de 06.03.2020.
Julga-se procedente o pleito de contratação de apólice de seguro de vida complementar, em favor dos condutores da LOGGI, com coberturas em caso de invalidez permanente, nos termos do art. 14 da Lei Municipal de São Paulo nº 14.491/07.
Julga-se procedente o pleito de pagamento de compensação pecuniária de R$30.000.000,00 (trinta milhões de reais), devido solidariamente pelas rés LOGGI e L4B, que deverá ser depositado diretamente junto às instituições beneficentes escolhidas pelas rés dentre as 100 melhores organizações não governamentais brasileiras, até 06.03.2019, com comprovação nos autos.
LÁVIA LACERDA MENENDEZ
Juíza Titular da 8ª Vara do Trabalho de São Paulo
SAO PAULO,6 de Dezembro de 2019
LAVIA LACERDA MENENDEZ
Juiz(a) do Trabalho Titular
- Ação Civil Pública Cível 10010588820185020008
- Contrato de Trabalho
- Da Aposentadoria Especial ao Motoboy