Cancelamento do Registro Imobiliário

Neste sentido, encontramos decisão do Supremo Tribunal Federal, de que foi relator o Ministro Marco Aurélio. Esta assim declarou: “O cumprimento do dever imposto pela Lei de Registros Públicos, cogitando­-se de deficiência de carta de adjudicação e levantando­-se dúvida perante o juízo de direito da vara competente, longe fica de configurar ato passível de enquadramento no artigo 330 do Código Penal – crime de desobediência – pouco importando o acolhimento, sob o ângulo judicial, do que suscitado” (Habeas Corpus 85.911/9­-MG, julgado em 25/10/2005).

Existem dois gêneros de cancelamento que ingressam na serventia imobiliária. O primeiro deles, em regra, decorre da quitação da dívida que ensejou o surgimento do direito real de garantia. Este tipo de cancelamento tem efeitos ex nunc, ou seja, a partir do momento em que foi este publicitado.

Já o segundo tipo de cancelamento de direitos inscritos na serventia imobiliária decorre justamente de casos em que os vícios contidos no título ocasionaram a invalidação do registro. Este tipo de cancelamento decorre da regra geral contida no § 2º do art. 1.245 do Código Civil, que diz: “Enquanto não se promover, por meio de ação própria, a decretação de invalidade do registro, e o respectivo cancelamento, o adquirente continua a ser havido como dono do imóvel”.

Normalmente tais cancelamentos demandam decisão judicial em ação específica. Isso é sempre necessário quando for de vício intrínseco ao próprio negócio, como vícios de vontade. Como exceção a esta regra geral, da necessidade de ação judicial, encontramos o disposto no art. 214 da Lei n. 6.015/73, que estabelece que “as nulidades de pleno direito do registro, uma vez provadas, invalidam­-no, independentemente de ação direta”.

Mas, por outro lado, faz parte do interesse público primário assegurar que todos os atos registrados sejam realizados estritamente em conformidade com a lei. Dessa forma, não o sendo, prevê a Lei de Registros Públicos um procedimento administrativo, dotado de necessário contraditório, que permite o cancelamento administrativo de atos registrados sem a observância dos requisitos legais, cancelamento que se denomina de nulidade de pleno direito, a qual “tipifica vício cujo reconhecimento deva ser inconteste, não podendo gerar dúvidas ou incertezas (...) é aquele apto a retirar a validade dos efeitos produzidos junto ao registro, e que seja incapaz de ser convalidado” (Direito registral imobiliário, p. 172).

No que se refere às matrículas, todavia, existe uma grande diferença entre o cancelamento e o encerramento delas, apesar de o legislador não ter feito esta diferenciação no art. 233 da Lei n. 6.015/73, que aborda o assunto, tratando qualquer dos atos como ato de cancelamento, apesar de, no art. 234 da mesma lei, referir­-se expressamente ao encerramento da matrícula.

De qualquer modo, trazendo a diferenciação consagrada pela nossa doutrina e jurisprudência, o cancelamento da matrícula se enquadra nos atos cancelamentos em geral e ocasiona a invalidação dela, com consequente invalidação dos possíveis atos nela praticados.

O encerramento da matrícula, por sua vez, consiste apenas no término dela, na indicação de que a partir daquele momento não se praticarão outros atos naquela matrícula, pelo fato de ela ter deixado de existir. Todavia, continua válida até aquele momento, sendo válidos e eficazes todos os atos nela praticados. Podemos citar como exemplo de uma situação que enseja o encerramento da matrícula os casos de unificação.

Também não há que no caso em análise se cogitar o crime de prevaricação (art. 319, CP), visto que agir de acordo com os ditames legais impostos pelo exercício de suas funções em nada se assemelha à prática de atos contra expressa disposição legal, visando atender a sentimento ou interesse pessoal.

O cancelamento poderá ser total ou parcial e referir-se a qualquer dos atos do registro.

Cancelamento é todo assento – com natureza de averbação – que tem por finalidade extinguir formalmente outro assento registral determinado, com menção da causa da extinção. Exerce papel relevante no Registro de Imóveis porque implica, em regra, no fim ou extinção de um registro ou averbação anterior. Estas graves consequências jurídicas recomendam especial cautela do registrador, até porque, ao contrário do que ocorre quando há suspensão ou denegação da inscrição, contra o cancelamento não há recurso na esfera administrativa, o que implica na extinção dos efeitos da inscrição cancelada.

O assento de cancelamento é acessório e negativo, por pressupor logicamente a existência anterior de um assento registral a cancelar. Por sua substância de negação de um assento preexistente, o cancelamento não possui autonomia própria, pois sua existência decorre da função destrutiva, do ponto de vista jurídico, de outro assento. Por esse motivo, o assento de cancelamento, tal como ocorre com qualquer averbação, não autoriza a abertura de matrícula, devendo ser realizada na transcrição, quando for o caso.

O cancelamento tem ainda um caráter de definitividade e, por isso, não é possível o cancelamento condicional. Vimos que o assento em tela tem um fundo negativo e aquilo que é negativo, por definição, é absoluto: ou é ou não é, não pode existir meio-termo ou condição. Além do mais, não se extingue o direito, e sim o assento, que ou existe ou não existe juridicamente. O direito pode ser condicional, mas não o assento.

O cancelamento efetuar-se-á mediante averbação, assinada pelo oficial, seu substituto legal ou escrevente autorizado, e declarará o motivo que o determinou, bem como o título em virtude do qual foi feito. 

Os registros e averbações podem ser cancelados por escrituras públicas ou documento autêntico em que o titular da inscrição registral, ou seu representante legal ou convencional, conceda seu consentimento.

O registro, enquanto não cancelado, produz todos os efeitos legais ainda que, por outra maneira, se prove que o título está desfeito, anulado, extinto ou rescindido.

Se, cancelado o registro, subsistirem o título e os direitos dele decorrentes, poderá o credor promover novo registro, o qual só produzirá efeitos a partir da nova data.

Além dos casos previstos na Lei n. 6015/73, a inscrição de incorporação ou loteamento só será cancelada a requerimento do incorporador ou loteador, enquanto nenhuma unidade ou lote for objeto de transação averbada, ou mediante o consentimento de todos os compromissários ou cessionários.

O cancelamento da servidão, quando o prédio dominante estiver hipotecado, só poderá ser feito com aquiescência do credor, expressamente manifestada.

O cancelamento não pode ser feito em virtude de sentença sujeita, ainda, a recurso. 

 

O cancelamento de hipoteca só pode ser feito

  1. À vista de autorização expressa ou quitação outorgada pelo credor ou seu sucessor, em instrumento público ou particular;
  2. Em razão de procedimento administrativo ou contencioso, no qual o credor tenha sido intimado (art. 698 do Código de Processo Civil);
  3. Na conformidade da legislação referente às cédulas hipotecárias.

 

 

Legitimados requerer o Cancelamento 

Far-se-á o cancelamento:

  1. Em cumprimento de decisão judicial transitada em julgado;
  2. A requerimento unânime das partes que tenham participado do ato registrado, se capazes, com as firmas reconhecidas por tabelião;
  3. A requerimento do interessado, instruído com documento hábil;
  4. A requerimento da Fazenda Pública, instruído com certidão de conclusão de processo administrativo que declarou, na forma da lei, a rescisão do título de domínio ou de concessão de direito real de uso de imóvel rural, expedido para fins de regularização fundiária, e a reversão do imóvel ao patrimônio público.
  5. O dono do prédio serviente terá, nos termos da lei, direito a cancelar a servidão.
  6. O foreiro poderá, nos termos da lei, averbar a renúncia de seu direito, sem dependência do consentimento do senhorio direto.

 

Efeitos do cancelamento

Conforme foi visto, o efeito do cancelamento é a extinção total ou parcial do assento afetado por ela. Ademais, ela produz outro efeito que decorre do princípio da legitimidade ou presunção de veracidade do registro: presume-se extinto o direito real ou situação jurídica real apenas quando se procede ao cancelamento de sua inscrição. Tal presunção é relativa, admitindo prova em contrário.

 

Questionário proposto somente àqueles que pretender o Certificado

 

 

Capítulo 1 - Aula 1. Natureza Jurídica da Serventia 

 

BIBLIOGRAFIA UTILIZADA

 

Reflexos dos Bens Incorpóreos no Direito Imobiliário