AS FASES E LIMITES DO PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO

 O planejamento tributário nem sempre foi concebido da mesma forma ao longo dos anos. Para se estudar mais a fundo os limites para a sua realização, necessário se faz uma análise das fases do debate sobre o assunto, as quais trouxeram, cada uma delas, novos limites à liberdade de realização do planejamento tributário. Marco Aurélio Greco (2008) divide em três as fases do debate sobre o planejamento tributário:

 

  • liberdade salvo simulação

Com relação às diferenças entre simulação e a elisão fiscal, no sentido da pratica de atos lícitos para a economia de tributos, Sampaio Doria (1977) elenca alguns critérios:

 

  1. natureza dos meios: para Doria, na elisão os meios empregados são sempre lícitos, enquanto que na simulação a ilicitude dos meio é escondida;
  2. ocorrência do fato gerador: na elisão utiliza-se de formas alternativas para impedir a verificação do pressuposto de incidência. Já na simulação, há a ocorrência efetiva do fato gerador, mas este “vem desnaturado, em sua exteriorização formal, pelo artifício utilizado” de forma que não é reconhecido em sua forma, como a hipótese de incidência prevista legalmente;
  3. eficácia dos meios — com relação à efetividade da forma jurídica adotada e sua consonância com o conteúdo, na elisão fiscal a forma jurídica, apesar de alternativa, é real, havendo, portanto, correspondência entre forma e conteúdo. Na simulação, entretanto, a forma jurídica adotada “é mero pretexto”, havendo incompatibilidade entre forma e conteúdo. Assim, os negócios jurídicos empregados discrepam radicalmente das características essenciais da realidade factual, ou seja, há uma “violência na adaptação da forma jurídica aos fatos”;
  4. resultados — na elisão, os resultados produzidos são próprios aos negócios jurídicos realizados. Por outro lado na simulação, os efeitos reais são diversos daqueles que aparentam ser, não se produzem os resultados naturais do negocio por conta da simulação.
  5. liberdade salvo patologias dos negócios jurídicos . Greco (2008) defende que a consideração de outras limitações ao planejamento tributário é reflexo de uma nova concepção de relação entre cidadão-Estado, conseqüência principalmente de novos valores de ordem social trazidos pela Constituição Federal de 1988.
  6. O abuso de direito - Assim diante de atos praticados com abuso de direito, cumpre ao fisco desqualificá-los para, em seguida, requalificá-los em termos de uma hipótese de incidência tributária para exigir o imposto que seria devido caso o negócio não ocorresse de maneira abusiva. Assim, a questão chave no que se refere ao abuso de direito é a motivação para a realização do negócio. Assim, para se verificar a ocorrência do abuso deve-se enfrentar as seguintes questões (Greco, 2008):

1) o motivo para a realização do ato ou negócio jurídico é extratributário?

2) no que consistia este motivo?

3) o motivo era suficiente para a realização do negócio nos moldes que foi feito?

 

Sobre a questão dos motivos, Greco (2008) propõe perguntar se o motivo a) é existente (se existia de verdade), b) é pertinente (se tinha a ver com o ato praticado e a alternativa menos onerosa), c) é suficiente (para fundamentar o modo e o momento em que o ato foi pratica), d) é congruente (para atingir o objetivo adequado diante daquele quadro)? Em conclusão, portanto, a acusação de abuso de direito poderá ser afastada se o contribuinte demonstrar a existência de um motivo extratributário, ou seja, por conta de um motivo não exclusivamente tributário, realizou atos dentro de um planejamento tributário buscando a alternativa que resultou numa menor carga tributária.

 

     7. A fraude à lei - Além do abuso do direito, a segunda fase de discussão sobre o planejamento tributário também apontou para a importância da figura da fraude à lei, prevista no art. 166, VI do Código Civil: Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando: VI — tiver por objetivo fraudar lei imperativa;

No caso do Direito Tributário, a fraude penal será uma fraude contra o fisco, na qual a conduta viola diretamente uma norma correspondente ao direito de crédito do fisco, escondendo ou impedindo o seu surgimento (Greco, 2008). É o caso das práticas previstas nos artigos 1° e 2° da Lei 8.137 já citados anteriormente. A fraude prevista nos artigos 149, VII e 150, §4° do CTN igualmente se referem à fraude neste sentido.

   8. Abuso de formas - A última figura que aparece como passível de descaracterizar o planejamento tributário é o abuso de formas. Trata-se da utilização abusiva de formas jurídicas lícitas com a finalidade de se obter redução do imposto a ser pago.

  9. liberdade com capacidade contributiva - Passa-se, assim, de um formalismo fiscal, em que se dá maior relevância às formas lícitas dos negócios jurídicos, a um realismo fiscal, em que se procura levantar o conteúdo, motivo e finalidade destes.

 

Assim, a possibilidade de planejamento tributário passa a ser muito restrita, na medida que não importará se o negócio “alternativo” foi realizado licitamente, sem abuso de direito, de forma ou fraude à lei. O que importará é o fato de denotar ou não capacidade contributiva de quem o realizou.

A essência desta terceira fase se encontra no princípio da capacidade contributiva, que seria um limite às operações de planejamento tributário. Assim, da perspectiva da capacidade contributiva, a lógica passa a ser a de que mesmo que os atos praticados sejam lícitos e não padeçam de nenhuma patologia ou invalidade — nem assim contribuinte pode agir da maneira que bem entender (Greco, 2008).

Questão fundamental relacionada ao tema trazida por Greco (2008), diz respeito a onde e como identificar a capacidade contributiva? Sobre o assunto, várias correntes se posicionaram sobre o tema, com as seguintes posições:

 

  1. Capacidade contributiva como disponibilidade financeira: nesta corrente, a capacidade contributiva se expressaria nas condições econômico-financeiras do contribuinte pagar tributos, ou seja, teria capacidade contributiva aquele que tivesse dinheiro disponível para o pagamento dos tributos, sem ter que se desfazer de seu patrimônio. Exemplo típico é o caso de viúva sem renda que herda mansão e que, nesta visão, não teria capacidade contributiva para pagar o IPTU (Greco, 2008) b) Capacidade contributiva como avaliação total do patrimônio de cada indivíduo: nesta visão, a capacidade contributiva para o pagamento de determinado tributo deveria ser aferida computando-se a totalidade do patrimônio do contribuinte e não separadamente com relação a cada tributo. c) Capacidade contributiva por presunção legal: a lei deve adotar critérios razoáveis para dentro de um contexto definir a capacidade contributiva.
  2. Capacidade contributiva como pressuposto de fato: a capacidade contributiva estaria ligada a características ao fato gerador ocorrido, que demonstrando sinais de riqueza, estaria por consequência sinalizando a capacidade contributiva do indivíduo que o realizou.